Filho não é joguete
Leopoldo Luz
Filhos transformados em instrumento de agressão podem sofrer traumas permanentes, mas há lei que coíbe a prática.
Separação não é fácil para ninguém. A relação antes estável torna-se pulsante e insegura, provocando no casal sentimentos alternados de atração e aversão, cada vez mais frenéticos, até que o mais impetuoso do casal, como que absorvendo toda energia emocional para depois expulsá-la, decide: fim. O outro, rebaixado pelo ato, sucumbe à decisão, não raro assumindo postura vingativa.
Infelizmente, muitos casais e ex-casais em crise, imersos em suas mágoas e culpas, não se apercebem dos males que causam aos inocentes filhos – já fragilizados por tudo testemunharem – forçando-os a tomar partido nas suas contendas.
Se antes, manipular menores contra seu genitor não trazia consequências jurídicas, com a publicação da Lei federal nº 12.318 em 26/08/2010, de iniciativa do deputado Régis de Oliveira, o Estado passou a ter instrumentos para coibir essa prática.
A lei brasileira abraçou a expressão alienação parental cunhada por Richard Gardner, pioneiro no estudo dos distúrbios de personalidade da criança que a levam a maltratar, em bases contínuas, um dos pais.
Segundo essa lei, alienação parental é, resumidamente, a interferência na formação psicológica do menor causada por um dos genitores, avós, ou quem quer que lhe exerça influência, para que o menor repudie um dos genitores ou para causar prejuízo ao vínculo do menor com ele.
São formas de alienação parental, entre tantas outras: dificultar o contato do menor com o genitor, desqualificar maliciosamente a conduta do genitor ou desautorizá-lo perante o menor, omitir do genitor informações relevantes sobre o menor, apresentar falsa denúncia contra o genitor ou seus familiares.
A lei reconhece que a prática de atos de alienação parental fere direito fundamental do menor, prejudica suas relações de afeto com o genitor alienado e com sua família, constitui abuso moral contra o menor e configura descumprimento de dever inerente à autoridade parental.
Por força da citada lei, o juiz, de iniciativa própria, ou a requerimento de interessado, ao tomar conhecimento de atos de alienação parental, deverá, ouvido o Ministério Público, tomar providências para cessá-los, visando preservar a integridade psicológica do menor e assegurar sua convivência com o genitor afastado ou viabilizar a reaproximação entre ambos, valendo-se, se necessário, de perícia psicológica ou biopsicossocial.
Constatado em juízo o ato de alienação parental, o juiz poderá, segundo a gravidade do caso, entre outras medidas: advertir ou multar o alienador, ampliar o regime de convivência do menor com o genitor alienado, determinar o acompanhamento psicológico ou biopsicossocial da família, alterar o regime de guarda do menor, fixar cautelarmente domicílio do menor e declarar a suspensão da autoridade parental do alienador.
Durante a pesquisa para redigir esta matéria, emocionei-me muito com os depoimentos registrados pelo jovem diretor Alan Minas no curta-metragem A morte Inventada: alienação parental, cuja audiência recomendo ao leitor. Nele, filhos de casais separados, hoje adultos, relatam suas amarguras e sentimentos de perda e de culpa por, quando crianças, terem se deixado conduzir por um dos pais a destratar ou rejeitar o outro.
Esperemos, então, que essa lei e as ações públicas e privadas de conscientização tenham alcance para mitigar a incidência da alienação parental no país.
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Para saber mais:
Lei nº 12.318/2010 – Alienação Parental
A Morte Inventada: alienação parental – Documentário de Alan Minas