Adoção

Pai é quem cria

Leopoldo Luz

Cerca de 32 mil crianças e adolescentes ainda aguardam, em abrigos, uma família substituta.

Papai, você sabia que a vovó foi adotada? Com essa pergunta direta, Pedrinho, intelectual aos sete anos, iniciou uma longa conversa, que, para resumir, terminou com outra pergunta não menos contundente: Papai, porque tem tanta gente pobre no mundo?

A adoção, além de ser, talvez, a maior demonstração de amor desinteressado que alguém pode dar, é uma ação social apta a trazer um futuro digno para crianças e adolescentes pouco afortunados no seu início de vida.

Ocorrem-me de pronto dois casos – você, certamente, lembrará de outros. O fundador da Apple e da Pixar e inventor do Ipod, Steve Jobs, foi adotado ainda criança. Sua mãe biológica, uma universitária solteira, cedeu o menino Steve, sob a exigência de a família substituta lhe prometer que ele, um dia, iria para a universidade. Mais perto de nós está Osmar Afrísio, órfão mineiro que chegando a São Paulo na década de 70 foi acolhido por Manoel e Abílio, sócios do Rei das Batidas, repouso etílico dos estudantes da USP. Desde então, Osmar Afrísio cursou pedagogia, publicou três livros de contos e, em 2023, recebeu o Título de Cidadão de São Paulo.

São aptos a serem adotados os menores de 18 anos órfãos, abandonados ou que, por qualquer motivo, foram retirados de sua família originária e seus pais tiverem sido destituídos do poder familiar.

O interessado em adotar uma criança ou adolescente deve ter mais de 18 anos e deve ser capaz de demonstrar – não importando seu estado civil, nacionalidade, sexo ou orientação sexual – que proverá um lar adequado para o adotado desenvolver uma vida digna. A diferença de idade entre adotante e adotando deve ser de, no mínimo, 16 anos.

Casais, hetero- ou homo-afetivos, não importa, podem adotar em conjunto, ainda que se separarem, desde que após o início do estágio de convivência com o menor.

O processo brasileiro de adoção se tornou muito simples, desde a publicação do ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente.

O interessado deve procurar a Vara da Infância e Juventude de sua comarca, levando documentos pessoais e comprovante de endereço. Se a adoção for de criança desconhecida do interessado, não será necessária a contratação de advogado.

Após algumas palestras ou entrevistas, será solicitado ao interessado o preenchimento de formulário em que ele descreverá o perfil da criança desejada.

A equipe de apoio do juiz realizará um estudo psico-sócio-pedagógico do interessado e o Ministério Público dará seu parecer. Vencida essa etapa inicial, o juiz deferirá a inscrição do interessado.

A seguir, serão apresentados menores e seus históricos aos inscritos, pela ordem, para que se decidam se querem conhecê-los. Se o menor eleito tiver mais de um ano de idade, haverá um estágio de convivência, supervisionado pelo juizado.

Finalmente, o adotante peticionará ao juiz a guarda provisória e a adoção do menor. Concedida a guarda, o menor já poderá ser levado pelo adotante. Concedida a adoção, será feito um novo registro de nascimento da criança ou adolescente que passará, para todos os efeitos da lei, a ser filho do adotante.

Em 2005, o IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada estudou o perfil das crianças e adolescentes abrigados e concluiu que 44% desses menores sequer tinham um processo na justiça, em flagrante desrespeito ao ECA, que determina a comunicação ao judiciário no prazo de dois dias úteis. Um em cada cinco menores abrigados aguardava uma família substituta havia mais de seis anos e apenas um em cada dez menores abrigados estava apto à adoção imediata. A falta de informação generalizada nos arquivos públicos era um dos principais entraves burocráticos à adoção, pois aumentava a distância entre os menores e os interessados em adotar.

Visando a combater essa deficiência, foi lançado, em 2008, o cadastro Nacional de Adoção, coordenado pela Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça, ferramenta digital que auxilia os juízes das Varas da Infância e da Juventude na condução dos procedimentos e processos e adoção. O Conselho Nacional de Justiça recomendou ainda, em decisão unânime, que todos os Tribunais de Justiça cumprissem o ECA, contratando psicólogos, assistentes sociais e pedagogos em quantidade suficiente para prestarem assessoria aos juízes nas causas relacionadas à família e a crianças e adolescentes. Para se ter uma ideia da eficácia dessa e de outras medidas, a fila de menores aguardando adoção caiu de 80 mil, em 2006, para 6,5 mil em 2016, o que ainda não deixa de ser alarmante.

Desde então, os números não param de crescer. Há mais de 32 mil crianças e adolescentes abrigados pelo Sistema Nacional de Adoção (SNA), sendo que destes, somente 4 mil conseguiram estar aptos a serem adotados.

Do outro lado da fila há cerca de 35 mil famílias cadastradas no SNA, o que mostra que para cada menor apto a ser adotado há 8 famílias qualificadas para adoção. Há relatos de que o seletivo perfil exigido pelos pretendentes seja o principal entrave para a adoção.

Se você gostaria de ajudar uma criança ou adolescente, mas ainda não está seguro quanto à adoção, pode se candidatar à guarda ou à tutela de menor.

Com a guarda, você cuidará de menor que, provisoriamente ou em definitivo não puder conviver com seus pais. A você será conferida a responsabilidade material, afetiva e educacional do menor. A guarda é normalmente conferida a abrigos, famílias guardiãs e pais adotivos durante o período de convivência e é renunciável pelo guardião.

Já mediante a tutela, você será instituído como representante legal de menor cujos pais faltem ou tenham sido destituídos do poder familiar, para gerir sua vida e administrar seus bens.

O guardião ou o tutor podem, mais tarde, peticionar a adoção do menor acolhido.

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Para saber mais:

CNA – Cadastro Nacional de Adoção

Jornal do Senado – Matérias Especiais – Adoção

Osmar Afrísio recebe o Título de Cidadão Paulistano

 

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